Por Thiago Martins e Bruno Cavarge
Conforme previsto na Constituição Federal, as trabalhadoras têm direito a quatro meses (120 dias) de licença-maternidade remunerada, custeada pela Previdência Social. No entanto, com o programa Empresa Cidadã, instituído em 2008 pela Lei nº 11.770, as companhias que aderem ao programa e que são tributadas pelo lucro real, podem prorrogar o benefício em troca de deduzir a remuneração paga às mães do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Muitas empresas que aderiram ao Programa Empresa Cidadã esperavam um parecer do Fisco, já que o programa possibilita ampliar em mais 60 dias o período para as mães cuidarem dos filhos em troca de incentivo fiscal.
A dúvida das companhias sobre o dever de tributar o salário pago na prorrogação da licença-maternidade surgiu depois de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2020, proferida em sede de repercussão geral.
Na ocasião, os ministros estabeleceram que é inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o saláriomaternidade (RE 576.967, Tema nº 72).
Ao afastar o recolhimento, os ministros consideraram que esse valor não é pago com habitualidade ou como contraprestação ao serviço prestado pela funcionária. Além disso, entenderam que a tributação geraria uma discriminação no mercado de trabalho, pois criaria obstáculos na contratação de mulheres e, consequentemente, violaria a garantia de igualdade entre gêneros.
Na semana passada, o tema foi debatido pela Receita Federal. O posicionamento do Fisco era aguardado pelas mais de 25.800 companhias que aderiram ao Programa Empresa Cidadã.
Assim, a Receita Federal publicou em 09/02 a Solução de Consulta nº 27, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) do referido órgão, sobre a tributação das empresas que oferecem licença-maternidade estendida para as funcionárias.
No entendimento da Receita Federal, há incidência da contribuição previdenciária sobre o salário pago durante os dois meses de prorrogação do benefício, não sendo aplicável a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema nº 72.
Na Solução de Consulta, o Fisco afirmou que a prorrogação do afastamento das mães ou adotantes é custeado por dedução do IRPJ, e não pelo Regime da Previdência Social, e que o objetivo do Programa Empresa Cidadã é afastar o prejuízo da remuneração apenas no caso da licença-maternidade.
Em razão desse entendimento, os fiscais do país deverão cobrar contribuição previdenciária sobre o salário pago durante os dois meses de prorrogação do benefício.
A posição da Receita pela tributação vai na contramão de manifestações da PGFN em ações judiciais.
Antes mesmo da manifestação do Fisco, várias empresas já estavam batendo às portas do Judiciário para questionar a exigência. Algumas, como o Grupo Carrefour (processo nº 5005384-95.2022.4.03.6100), obtiveram decisões favoráveis para afastar a tributação. Segundo a Fazenda Nacional o impacto estimado do julgamento é de perda anual de arrecadação de R$ 1,3 bilhão.
O reflexo do entendimento da Receita poderá gerar contencioso sobre um tema que, depois de tantos anos de discussão, havia sido pacificado pelo STF.
Entendemos que os pagamentos feitos a título de licença-maternidade estendida possuem nítido caráter indenizatório e, consequentemente, não deve incidir contribuição previdenciária, tendo em vista que não há prestação de serviço nesse período.
A Equipe Tributária do Coelho & Morello está sempre atenta às movimentações na seara tributária e preparada para orientá-los de forma segura.